quinta-feira, 11 de março de 2010

O Burro e o Amo

Meninos e meninas, hoje vou-vos contar uma história que a minha avó me contava antes de me adormecer no calor dos seus seios, e que versa sobre esperteza e a importância de ter burros resistentes.

Um gemido horrendo assolou,
E toda a gente estacou,
Menos um que era deficiente
E, inocente, o perigo enfrentou:
"Quem vem aí de trás?
Aparece, ò Barrabás!
Que te corto num ninho a pila
Se não me dizeis quem sois!
E dou-a de comer aos bois
Quando acabar o feno magnífico
Pois que até lá aguenta
Conservada no meu frigorífico."
Ninguém respondeu,
E o deficiente estremeceu
De tanto tempo à espera:
Teve um espasmo nervoso
Antes de enfrentar a fera.
Logo a sua irmã acorreu
E enrolando um jornal lhe bateu:
"Asno, asno!
Disse-te que estivesses quieto.
Além de deficiente és insurrecto
E por isso levas no lombo
Com este jornal te tombo,
Para que aprendas o que é correcto!"
Então, outro grito,
E um choro de criança...
O medo fede pela vizinhança
E o Mal sem se revelar.
Começam as pessoas no pânico
A gritar e a correr em rodas...
Estúpidas, acabam por se vomitar todas
E sujam as roupas novas.
Então eis que o monstro aparece
Montado num burro de pão-de-ló:
"O meu nome é Jacó,
E venho praticar o mal,
Montado em pão-de-ló,
Vou acabar com o Natal!
Digam adeus ao bacalhau,
E ao presépio também
Isto será o Inferno,
Verão o que ele contém:
Chupa-chupas de cáries,
Bolos de romela amarela,
Programas da Júlia Pinheiro
E casas sem uma única janela.
Não há cães de estimação,
Nem desenhos animados
Esqueçam panados no pão
Governarão os abichanados.
Adeus verdes jardins
E bancos onde sentar
E os velhotes reformados,
Vão voltar a trabalhar!
A Floribela será ministra
E venerarão as galinhas,
Os homens ficarão sem picha
E as mulheres sem pombinhas
Ajoelhem-se agora perante mim
E venerem-me como vosso Mestre
Deêm-me jóias de marfim e já agora,
Digam-me que cheiro a vómito é este"

Bem, ao ouvir isto, o povo,
Acordou da sua condição
Podiam suportar tudo
Mas a Floribela a governar,
Isso não!
Pegaram então em froquilhas,
E beberam o sumo da uva
Afinal povo que é povo,
Luta bem é com visão turva!
Matias, o deficiente,
Recuperado da coça levada,
Quis também ir à luta,
Mostrar que sabia dar porrada.
Pegou do toco de madeira
A machada lá cravada,
E dando o seu grito de guerra
Partiu p'rá bofetada.
Azarado do rapaz
Que de treino nada tinha
Ao levantar a machada
Cortou a cabeça errada
A de Cremilde, a sua irmãzinha.
Ficou raivoso o rapaz
E dirigindo-se a Jacó
Gritou como o Tarzan faz
Tanto, até fazer cocó:
"Barrabás vai retro
Que agora isto vai azedar,
Depois de cagar nas calças
Não há como me envergonhar.
Não sei manejar a machada,
Mas ainda sei provocar dor!
Cuspo-te leite p'rós olhos,
Vais sofrer com o ardor!
Puxo teus cabelos com força
E faço o pontapé do porco
Arranco e bufo-te para a boca
Pêlos púbicos de cão morto!
Hei-de telefonar à Maya
E ao Claúdio Ramos também
E na Tertúlia-Cor-de-Rosa,
Vão-te tratar com desdém!
Atiçar-te-ei ciganos
E camelos marroquinos!
Prendo-te lagostas no escroto
E torço-te os mamilos finos."
Dizendo isto, foi Matias
A correr que nem um louco,
Na cadeira de rodas tunning,
Sem recear, nem um pouco.
Nem prestou atenção aos demais
Que por ele gritaram -"Matias...!"
E quando atravessava a estrada,
Despistou-se um camião de sucatas,
E cortou o rapaz às fatias!
O pânico assolou de novo
Com outra morte do pé para a mão
E a aldeia num gesto sincronizado
Voltou a vomitar no chão!
"Que nojo de terra esta,
Que ia eu escolher para reinar.
Isto não é gente, são cabras,
Que estão sempre a vomitar.
Trovão, vai a galope,
Outro sitio assolaremos.
Aqui há deficiente e porcos,
Não há motivos para que fiquemos.
Das trevas vos livro, ó gentes!
Já nem volto a pôr cá o corpo.
De tão enojado que estou,
Desta terra de bicho morto!"
Ia o burro a arrancar,
Quando um problema surgiu
Tanto vomitado fora
Que as pernas lhe atingiu.
E como o pão-de-ló é mole,
Com aquilo demolhou
E o burro partiu e caiu
E seu amo no pútrido tombou.
Gritava de nojo o amo
E o burro de dor também.
Mas como eles tinham sido maus,
Não os foram ajudar, ninguém!
E apodreceram no sítio
Sem se poder movimentar
Tornaram-se local de culto,
Para os miúdos que os iam gozar.

A história termina assim,
Com este triste fim.
Mais podia haver para contar,
Se o amo tivesse ido a outro lugar.
Mas a mania tomou conta dele
Desse senhor das trevas, Jacó.
Que sismara em invadir Vomilândia,
Num burro feito de pão-de-ló.
Agora não ficou para a História,
Por pouco esperto ter sido,
Se fosse num burro de bolo-rei,
Com a fruta cristalizada que tem,
Podia ainda estar vivo.

FIM

Xico Cruz, o Merdas

Sem comentários:

Enviar um comentário

Desbasta! Exorciza essa tua "mind-created" pseudo desbastadela cá para fora. Nem que seja por uma vez na vida, sê livre.